Almocei sozinha hoje, pela segunda vez na semana. Sempre tive um sentimento contraditório em relação à solidão. Odeio estar só, mas é só quando estou sozinha que me encontro. Por isso, às vezes, lhe sou grata. E hoje foi um desses dias.
Em meio a um burburinho incessante, comum ao maior shopping da América Latina no horário do almoço, entre estômagos famintos, entre passos apressados, deparei-me com o silêncio. Pedi licença para sentar-me a seu lado, e ela assentiu numa voz suave e, cabisbaixa, se desculpou. "Desculpa" - disse.
Lia, compenetradíssima, um livro de papel reciclado. Indiferente a tudo. Presa em seu mundo. Despertou momentaneamente ao sorrir de uma criança, e devolveu-lhe o sorriso. Em minha torpe imaginação, chamei-lhe Carina. Carina era a típica menina tímida da escola, longe de ser popular. Será que Carina se importava? Será que queria ter nascido bela? Reconheci parte de mim em Carina. Parte de mim perdida no tempo, na adolescência de sonhos falsamente realizáveis e de dores inacabáveis. Desejei ser Carina. Despercebida, em paz com ela mesma.
A palavra desculpa ecoava ainda em minha mente. Por que teria me pedido desculpas? Por estar ali, ocupando um espaço que supostamente não deveria ser dela? Por não pertencer àquele lugar? Definitivamente, não era Carina, e sim o lugar que não lhe pertencia. Ignorante a isso, Carina lia. E pedia desculpas, por existir.